Introdução
O segmento de sucos de uvas no Brasil vem crescendo nos últimos anos. A popularização das informações sobre os efeitos benéficos do suco de uva para a saúde humana tem contribuído para os aumentos crescentes de consumo per capta no Brasil.
A produção de uvas de suco no país é totalmente realizada a partir de uvas americanas, como Vitis bourquina e híbridas de V. labrusca. Com exceção das cultivares Niágara Rosada e Niágara Branca, que no Brasil tem tripla finalidade (mesa, sucos e vinhos de mesa), as demais são uvas tintas, principalmente pretas azuladas, sendo a maioria muita rica em matérias corantes (antocianinas) e com altos índices de compostos fenólicos totais. Os imigrantes italianos, que colonizaram a região da Serra Gaúcha no sul do país, tiveram o primeiro contato com as uvas americanas, especificamente a cultivar Isabel, por intermédio dos colonos alemães, que já estavam instalados na encosta da Serra Gaúcha. Entretanto, foi por meio dos italianos que a cultivar Isabel se disseminou no sul do país, inicialmente, para a elaboração de vinho de mesa e, mais tarde, para a elaboração de sucos. Ainda hoje, a produção de uvas americanas e híbridas representa 80% da produção de uvas para processamento no Brasil. Mais recentemente, o cultivo de uvas americanas e a produção de sucos no Brasil vêm ganhando importância também em regiões de clima tropical, especialmente no Nordeste do país.
A seguir, apresentamos um panorama do segmento de elaboração de sucos de uva no Brasil, que engloba aspectos como a evolução do mercado, a diversidade da matriz de cultivares e das regiões de produção, além de tópicos relacionados com a tecnologia agroindustrial
O mercado de sucos de uva no Brasil: tendência de crescimento
A legislação que regulamenta os produtos do segmento da cadeia produtiva que processa uvas americanas e híbridas no Brasil, como o “vinho de mesa”, o “suco de uva” e seus derivados, define que este último se divide em duas categorias: “suco pronto para beber” (suco natural/integral, suco reprocessado, suco adoçado, mosto de uva e polpa de uva) e “suco concentrado”.
Nos anos 2000, o mercado destes produtos sofreu mudanças significativas, que induziram o surgimento de iniciativas inovadoras importantes, principalmente no que se refere às estratégias de mercado e gestão do negócio, possibilitando superar as ameaças à sustentabilidade da produção de uvas americanas e híbridas no Brasil. Neste período, o mercado interno brasileiro registrou duas invasões: a primeira, dos vinhos importados e a segunda, promovida por uma gama de novos produtos, substitutos e competidores diretos dos vinhos de mesa. Trata-se de produtos como coquetéis, sangrias e outros que se apresentam no mercado a preços baixos, como se fossem vinhos, confundindo e induzindo os consumidores ao erro, tomando uma parte do mercado brasileiro de vinho de mesa. Neste contexto, grande parte da produção de vinho de mesa do estado do Rio Grande do Sul (RS) se viu significativamente diminuída. Diante da ameaça de repercussão direta em toda a cadeia produtiva vitivinícola gaúcha, surgiram iniciativas inovadoras que, diante da sinalização/identificação de novas oportunidades oferecidas pelo mercado, deram início a um ciclo inovador, tanto na dimensão da organização da produção, quanto da gestão do negócio destes dois segmentos da cadeia produtiva vitivinícola.
Aproveitando a boa imagem do suco de uva, projetada a partir da divulgação de trabalhos científicos relacionando o seu consumo à saúde, beleza, longevidade e outros benefícios, as empresas produtoras, independentemente do tamanho (pequena, média ou grande) ou categoria (cooperativa, empresarial ou familiar), começaram a estruturar seus projetos no sentido da obtenção de matérias primas de melhor qualidade, quer pela inclusão de novas variedades, criadas pela Embrapa, quer pelo maior controle e rigor na escolha do material vegetativo usado (variedades e sanidade) na expansão e/ou reconversão da matriz produtiva setorial. Em paralelo, e de forma mais intensa, foram realizados novos investimentos nas estruturas físicas e tecnológicas das empresas produtoras de suco de uva e vinho de mesa.
Na dimensão do negócio, os resultados e impactos gerados a partir do rearranjo estrutural ocorrido neste segmento da vitivinicultura, podem ser avaliados com base nas estatísticas de produção e de comercialização do suco de uva e vinho de mesa, no Rio Grande do Sul, maior produtor nacional, e único a dispor de estatísticas oficiais, motivo pelo qual tomaremos esta base como referência nas análises a seguir (Embrapa, 2018c).
Por tratar-se de um registro que assume um papel referencial desta análise destacamos a estabilidade, com tendência de crescimento, da produção das variedades de uvas americanas e híbridas no Rio Grande do Sul, mesmo considerando eventuais oscilações normais de cada safra e a frustração ocorrida na safra 2016, em função das condições climáticas desfavoráveis (Tabela 1). Verifica-se, no período 2004/2017, um crescimento de 32%. Este número é ratificado pelo crescimento do volume médio do período, que foi de 8%, mesmo incluindo os valores atípicos de 2016. Relativamente ao destino das uvas produzidas, observa-se que, tanto em termos absolutos (Tabela 1), quanto relativos (Figura 1), um crescimento expressivo da demanda pela matéria-prima (uva) para ser processada na forma de suco. Tomando como referência apenas os anos dos extremos do período de análise, verificamos que esta demanda cresceu de 122,8 mil toneladas, 24,3% da produção, em 2004, para 354,7 mil toneladas, 53,1%, em 2017. O crescimento do volume da uva destinada à produção de suco entre 2004 e 2017 é de 189,0%. Em relação ao volume médio registrado no período, de 237,1 mil toneladas, este crescimento foi de 93%.
Também chama atenção na Tabela 1, a demanda estável, em termos absolutos, por uvas para processamento em vinho de mesa. A comparação da demanda para este produto, entre os anos de 2004 (383,5 mil t) e de 2017 (313,9 mil t), mostra que houve recuo de 18%; quando esta comparação é realizada com a média do período (273,5 mil t), o recuo foi de 29%. Assim, depreende-se que, com o aumento da oferta de uvas para processamento a partir de 2011, a demanda crescente do segmento suco está sendo atendida sem comprometer àquela do segmento vinho de mesa, que se mostra estabilizada. Fazendo-se o mesmo tipo de análise a partir dos números da Tabela 2, se pode observar o crescimento vertiginoso dos referidos volumes.
Vale ressaltar que este crescimento verificado no mercado do “suco pronto para consumo”, refere-se, quase que exclusivamente, à demanda do mercado interno o que, em condições normais, possibilita maior agilidade nas vendas e evita as incertezas do mercado internacional. Soma-se a isto, o fato de não termos concorrência internacional neste tipo de produto, já que, grosso modo, somos um dos únicos países do mundo que produz e comercializa produtos vitivinícolas com base em cultivares de uvas americanas e híbridas.
Os desdobramentos havidos a partir dos rearranjos registrados no segmento da vitivinicultura que envolve a produção de “vinhos de mesa” e “suco de uva”, a julgar pelos dados apresentados, evidenciam uma mudança de cenário, onde se projeta uma “nova” e promissora etapa em consolidação para ambos os segmentos. A despeito dos ajustes e melhorias necessários, mormente na questão tecnológica da produção vitícola e das relações comerciais entre os viticultores e as indústrias, pode-se inferir que o cenário presente é positivo. Por fim, estamos tratando de um segmento da cadeia produtiva que, historicamente, esteve envolvido na produção e comercialização de produtos derivados de uvas americanas e híbridas, por vezes vistos com desconfiança pelo mercado e vendidos com baixo valor agregado. Entretanto, nos últimos anos, este segmento apresenta uma trajetória que, com base em ajustes inovadores, tanto da questão técnica quanto de gestão estratégica, está conseguindo se reposicionar e se consolidar num outro, e bem melhor, patamar de mercado.
A matriz brasileira de cultivares de videira para processamento de suco
Até um passado recente, a indústria brasileira de sucos tinha disponível como matéria prima principal as uvas das cultivares híbridas americanas, consideradas tradicionais: (i) Isabel, também conhecida como Isabella, que se destaca pelo grande volume de produção e também aroma e sabor aframboesados, típicos do suco de uva apreciado pelos brasileiros; (ii) Bordô, também chamada de Ives, rica em antocianinas e, consequentemente, em matéria corante, e também resistente às principais doenças; e, (iii) Concord, por ser a uva tradicionalmente usada nos EUA para elaboração de sucos e, por consequência, ter se tornado referência do sabor e aroma do produto em nível mundial. Clones mais precoces de Isabel (Isabel Precoce, 33 dias de maturação antecipada) e de Concord (Concord Clone 30, 15 dias de antecipação) foram identificadas ao longo dos anos de cultivo no Brasil. Outras cultivares usadas para o processamento de sucos, mas em uma escala pequena e localizada, são a cultivar americana Niágara Branca, que resulta em um produto de cor branca, e a sua mutação de cor identificada no Brasil, Niágara Rosada, que resulta em um suco de coloração violácea bem clara. O baixo rendimento glucométrico das cultivares tradicionais e de seus clones; a não adaptação de Bordô e Concord em clima tropical; e a deficiência de cor nos produtos elaborados com uvas de ‘Isabel’ e de ‘Concord’ e suas mutações, constituíram as principais barreiras tecnológicas para a expansão da indústria de sucos no país, principalmente para regiões de clima mais quente. Por outro lado, no sul do país, o período de safra das cultivares tradicionais limitava-se a cerca de cerca de 25 dias, o que concentrava as atividades tanto na propriedade, quanto na indústria. Uma das principais abordagens para solução destes entraves foi a criação de novas cultivares, no âmbito do Programa de Melhoramento Genético Uvas do Brasil (Figura 2), mantido pela Embrapa Uva e Vinho desde o final dos anos 1970. As principais características destes materiais incluem melhores atributos de qualidade, como coloração adequada, alto conteúdo de açúcares e baixa acidez, além de ampla adaptação climática e ciclos produtivos variados (Figura 3). A diversidade da matriz brasileira de cultivares para elaboração de sucos de uva permite o planejamento de combinações ou cortes entre sucos originados de diferentes cultivares. O objetivo é melhorar a qualidade do produto final, tanto em relação à coloração violácea intensa, preferida pelo consumidor brasileiro, quanto em termos de equilíbrio entre doçura e acidez, que pode variar de acordo com preferências do consumidor alvo (Ritschel e Sebben, 2010).
Duas novas cultivares foram desenvolvidas com o emprego de seleção clonal. A cultivar Concord Clone 30 (2000) é recomendada para cultivo na região da Serra Gaúcha, como alternativa para ampliação do período de produção e processamento de sucos, podendo alcançar produtividades de até 30 t.ha-1. Apresenta vigor fraco e dificuldade de brotação de gemas em regiões tropicais, mas pode ser produzida em climas subtropicais, em regime de um ciclo anual. Outro clone precoce originado a partir de uma cultivar tradicional é Isabel Precoce (2003), que também é recomendada no sul do país para ampliação do período de colheita e de processamento da uva. Em regiões de climas mais quentes, inclusive tropicais, a Isabel Precoce é recomendada para elaboração de sucos, oferecendo a possibilidade de realização de duas colheitas durante o período de estiagem (Camargo, Tonietto e Hoffman, 2011).
Cinco cultivares inéditas de uva foram desenvolvidas por meio de um programa de hibridações, que completa 40 anos (Embrapa, 2018b). O destaque é a evolução que se observa em relação aos altos conteúdos de matéria corante e de açúcares e a baixa acidez, que se observa entre o lançamento de BRS Rúbea, em 1999, e de BRS Magna, em 2012 (Figuras 2 e 3). A BRS Magna (2012) é uma cultivar para a elaboração de suco, com ampla adaptação climática, lançada como uma alternativa para a melhoria da cor, da doçura e do sabor do suco. É uma cultivar sensível ao míldio exigindo cuidados especiais no controle preventivo, semelhante ao usado para cultivares europeias (V. vinifera). Esta deficiência é fortemente compensada pela excelente qualidade da uva, mesmo em produções bastante altas. Em áreas tropicais, observou-se a incidência de oídio, mas sem relatos de danos que resultassem em perdas financeiras. O suco é rico em matéria corante e pode ser varietal, fazendo da ‘BRS Magna’ uma cultivar completa, que pode também ser utilizada em cortes com outras cultivares conferindo-lhes cor, doçura, aroma e sabor. A cultivar tem contribuído para viabilizar a produção de suco de uva no Vale do Submédio São Francisco (VSF), no semiárido nordestino (Maia et al., 2013).
Regiões vitícolas brasileiras dedicadas à elaboração de suco de uva
Além da ampla diversidade genética, a viticultura brasileira voltada para a produção de sucos é praticada em diferentes condições ambientais e sistemas de cultivo.
Produção em regiões de clima temperado e subtropical
A viticultura de clima temperado é praticada no sul do país, nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e parte do Paraná, e é similar àquela adotada em regiões vitícolas tradicionais (Protas e Camargo, 2011). Caracteriza-se pela ocorrência de um período de dormência, provocado pelas baixas temperaturas de inverno, e que resulta em apenas um ciclo produtivo. Também é praticada em regiões de altitude dos estados de São Paulo e Minas Gerais.
Na viticultura subtropical, embora a videira apresente um período de dormência natural em meados do inverno, é possível praticar um ou dois ciclos vegetativos (duas colheitas por ano), dependendo do tipo de manejo adotado. Esta situação é típica em regiões como o norte do estado do Paraná e o leste do estado de São Paulo, onde os invernos são amenos e curtos, com possiblidade de geadas (Camargo et al., 2011).
A Serra Gaúcha, onde está localizado o maior polo vitivinícola brasileiro, situa-se no nordeste do estado do Rio Grande do Sul. As áreas vitícolas são pequenas e os produtores comercializam a uva diretamente nas indústrias ou estão organizados em cooperativas, que são responsáveis pelo processamento. Os preços mínimos são definidos pelo governo, considerando a cultivar e o conteúdo de açúcares. Cada incremento de 1ºBrix no teor de sólidos solúveis (SS) do mosto corresponde a um aumento do preço da uva. Na Serra Gaúcha, e na maior parte Rio Grande do Sul, o sistema de produção predominante é a “latada’ ou “pérgola” (horizontal), sobre o porta-enxerto Paulsen 1103, que é tolerante à fusariose, doença muito comum na região. A poda mista é realizada entre os meses de julho e agosto; enquanto que a colheita ocorre entre os meses de janeiro e março. As produtividades encontram-se na faixa entre 10 e 30 t.ha-1. As cultivares de uvas americanas e híbridas mais comuns na região são Isabel, Bordô (Ives), Concord, Niágara Branca e Niágara Rosada. As produtividades obtidas em regiões de clima temperado são baixas, quando comparadas com aquelas obtidas em regiões tropicais. Contribuem para isso diversos fatores, tais como a idade avançada dos parreirais e problemas fitossanitários que causam o declínio e morte de plantas, como viroses, pragas e fungos de solos. A realização da pré-poda nos vinhedos, durante o inverno, visando o melhor aproveitamento da mão de obra familiar é muito comum, pois contribui para a redução da demanda posterior, durante as podas. Em geral, não se faz a poda verde, nem a grampeação dos brotos.
O estado de Santa Catarina é o segundo maior produtor de uvas para processamento. O Vale do Rio Tijucas concentra a produção de suco de uvas. A estrutura produtiva vitícola da região conta com aproximadamente 150 ha de videiras nos municípios de Nova Trento e de Major Gercino, com predominância das cultivares americanas Bordô e seu clone ‘Grano D’Oro’, ‘Niágara Branca’ e ‘Niágara Rosada’, as quais são produzidas principalmente sob o sistema de condução horizontal. As outras regiões vitícolas destacam-se a produção de vinhos finos e de Niágara Rosada para mesa, mas a produção de suco apresenta tendência de alta.
No estado do Paraná, a produção de uvas para elaboração de suco está concentrada em duas regiões, uma no norte do estado, e outra na região metropolitana de Curitiba. No norte, a produção concentra-se na região do município de Londrina. O clima da região permite a realização de dois ciclos produtivos anuais, quando se empregam cultivares precoces. Entretanto, cultivares tardias, produzidas em apenas um ciclo anual, como Isabel e BRS Carmem, vem sendo usadas pela indústria regional de suco de laranja concentrado, visando o aproveitamento de planta industrial já estabelecida. Nesta estratégia, a poda é realizada em agosto e a colheita, entre janeiro e fevereiro, e assim a uva é processada durante a entressafra da laranja. Já existem 259 hectares na região, grande parte em produção. O cultivo é realizado em sistema de condução GDC sobre o porta-enxerto IAC 766 ‘Campinas’, sem uso de irrigação. Na região de Curitiba, o cultivo de uvas para elaboração de sucos, Bordô, Isabel, Isabel Precoce, Concord e Concord Clone 30 vem sendo estimulado, especialmente por vinícolas regionais.
Produção em regiões de clima tropical
A viticultura tropical é praticada em regiões onde as temperaturas mínimas anuais não são suficientes para a indução do período de dormência. Assim, as plantas crescem continuamente, sendo possível a realização de duas ou mais safras programadas por ano, no mesmo parreiral (Camargo et al., 2011). Atualmente, o principal polo de viticultura tropical voltado para a produção de suco de uvas no Brasil é a região semiárida do Vale do São Francisco, onde as condições climáticas não apresentam muita variação durante o ano. Nesta região, as normais mensais de temperatura média do ar variam de 24ºC a 28ºC, sendo as máximas de 29,6ºC a 33,9ºC, e as mínimas de 18,2º a 22,1ºC, com 350 mm anuais de chuva concentrados no período de janeiro a março. A atividade apresenta também expansão para regiões de clima tropical úmido, como nos estados do Espírito Santo, Goiás e no município pioneiro de Nova Mutum, no Mato Grosso (Protas e Camargo, 2011).
No final dos anos 1990, empreendimentos privados visando a elaboração de suco de uva em regiões de clima tropical, baseados na cultivar ‘Isabel’, evidenciaram o potencial da atividade nestas áreas. Entretanto, com exceção desta cultivar, não havia alternativas de uvas do tipo “labrusca” para cultivo em climas mais quentes, com aptidão para elaboração de sucos. Por meio do acompanhamento destes projetos exploradores, especialmente em Mato Grosso, foram identificadas várias oportunidade de melhoria, como o desenvolvimento de cultivares de ciclo curto de maneira a possibilitar a realização de mais de um ciclo produtivo durante o período seco. Como o suco elaborado com a cultivar ‘Isabel’ apresenta coloração mais avermelhada que violácea, tornava-se indispensável a obtenção de cultivares tintureiras com ampla adaptação climática, que expressassem alta fertilidade e cor violácea intensa facilmente, mesmo sob temperaturas altas. Isabel Precoce, BRS Cora, BRS Violeta e BRS Magna vieram preencher estas lacunas. Atualmente, as indústrias implantadas em áreas tropicais usam a uva ‘Isabel Precoce’ em associação com uma cultivar tintureira (‘BRS Violeta’, ‘BRS Cora’ ou ‘BRS Magna’) para melhorar a cor do produto final (Maia et al., 2013).
No Vale do São Francisco, a produção se dá em sistemas de condução predominantemente ‘pérgola’, com uso de porta-enxertos de clima tropical (‘IAC 572’ e ‘IAC 313’) e uso de irrigação por gotejamento. O destaque é para o uso combinado de Isabel Precoce e BRS Magna, cultivares precoces que se destacam pela produção nas gemas basais e pelo vigor alto. Estas características permitem a realização de 2,3 ciclos produtivos por ano, em sucessivas podas de produção, perfazendo 30 a 35 ton.ha-1 por safra, ou cerca de 65 t.ha-1 por ano. O corte usado normalmente é de 50% de Isabel Precoce e de BRS Magna. Após sete a oito ciclos produtivos as plantas são substituídas por mudas enxertadas com 2 meses de idade. Em 12 meses, já se consegue formar as novas plantas e obter a primeira safra. Além disso, no clima semiárido, as cultivares adaptadas alcançam facilmente SS entre 18° e 20ºBrix, mesmo em produtividades elevadas. Assim, para elaboração de suco concentrado com a BRS Magna, são necessários 5,50 kg de uvas para 1 kg de suco a 60ºBrix. Esta estratégia de produção torna o custo da matéria prima no Vale do São Francisco equivalente ao das regiões tradicionais na elaboração de suco, no sul do país, garantindo assim a competitividade da indústria tropical. Outras cultivares também vem sendo utilizadas, em menor escala, para produção de sucos no Vale do São Francisco, como BRS Violeta e BRS Cora (20-30%) combinadas com Isabel Precoce (70-80%). A proporção do corte varia em função do mês de produção das uvas e de elaboração dos sucos. Por exemplo, as colheitas que ocorrem entre maio e agosto, pode-se aumentar a quantidade de Isabel Precoce, pois neste período as temperaturas não são tão elevadas, com mínimas de 18-20ºC à noite, o que faz com que os sucos apresentem coloração mais intensa. Por outro lado, nas colheitas ocorridas entre outubro e fevereiro, a Isabel Precoce apresenta certa deficiência de coloração, sendo necessário aumentar a quantidade das outras três variedades, em diferentes proporções. Desta forma, os sucos apresentam coloração violeta, são bastante frutados, típicos, com elevados teores de açúcar e acidez refrescante.
A tecnologia agroindustrial: sistemas usados para a elaboração de suco de uva no Brasil
As etapas gerais da produção de suco de uva são: (i) seleção de cachos/grãos, desengace e esmagamento das uvas; (ii) extração do suco (por diferentes métodos); (iii) prensagem do bagaço, filtração e clarificação; (iv) envase e estocagem.
O melhor suco é o extraído por esmagamento e prensagem de uvas frescas, sãs e maduras. Neste processo, ocorre a liberação abundante de borras, que podem ser separadas do suco por decantação, filtração ou centrifugação. Após a separação das mesmas, o suco límpido deve ser pasteurizado a cerca de 80°C, de modo a eliminar microrganismos e enzimas, preservando as características positivas de aroma e sabor. Após a pasteurização, o suco é envasado, resfriado e acondicionado para a venda.
A extração do suco pode se dar basicamente por dois processos: sulfitagem ou aquecimento. Cada processo tem diferentes variantes de aparatos tecnológicos e procedimentos (Rizzon et al., 1998).
O processo de sulfitação ou sulfitagem, também conhecido como Método Flanzy, consiste em macerar a uva esmagada por alguns dias em ambiente saturado por solução de enxofre, que promove a extração de líquido e também a proteção química de certos compostos orgânicos nele contidos. Posteriormente, mosto é separado. O suco assim obtido pode ser estocado por determinado tempo ou dessulfitado imediatamente para envase. Este sistema é normalmente usado no processamento de grandes volumes de uva.
A elaboração por aquecimento, por sua vez, consiste em aquecer a uva (desgranada, esmagada ou não), a temperaturas entre 70°C e 80°C, causando o amolecimento ou dissolução parcial das partes sólidas das bagas (polpas e cascas) e liberando o suco nelas contido. Em seguida, o mosto é separado e o engarrafamento a quente. Este processo é conhecido como método Welch. Os principais processos utilizados para elaboração do suco de uva por aquecimento são a extração usando panelas extratoras ou usando trocadores de calor e suas variações.
A panela extratora por arraste de vapor é uma derivação do método Welch. Trata-se de um aparato simples, que pode ser construído sob muitas variantes. O modelo mais básico é composto de uma fonte de calor (caldeira, fornalha, vaso de aquecimento ou queimador a gás ou a óleo Diesel), que aquece um recipiente (panela) contendo água potável. Na parte superior está acoplada uma segunda panela, com pequenos orifícios em sua parte inferior, a qual contém a uva desgranada e intacta. O vapor d’água formado pela fervura desta sobe e passa através das bagas de uva, amolecendo-as. Desse modo, o suco das bagas amolecidas é liberado e recolhido diretamente em um contêiner. O suco assim obtido pode ser imediatamente engarrafado, ainda quente, ou ser resfriado para a decantação das borras para mais tarde sofrer pasteurização e envase.
Apesar das vantagens práticas e econômicas da elaboração de suco de uva pelo método da panela extratora por arraste de vapor, o uso da técnica implica na adição de água ao suco, que advém do vapor de água que atravessa a uva desgranada colocada na panela extratora. O mesmo, em contato com a uva, condensa-se parcialmente. A legislação brasileira relativa ao tema define textualmente que “o suco deve corresponder exatamente aos atributos da uva que lhe deu origem”. Desse modo, este sistema, embora tenha sido tradicionalmente usado por pequenos produtores no Brasil, tende a cair em desuso.
Visando contornar a adição de água ao suco, o suquificador integral é uma panela extratora desenvolvida recentemente para a elaboração de suco integral em pequenos volumes (Embrapa, 2018a). O conjunto ideal de equipamentos necessários ao sistema de produção de suco de uva integral em pequeno volume é composto de uma desengaçadora/esmagadora manual ou elétrica, processador (suquificador integral), prensa manual, refrigerador e engarrafadora manual. O suquificador integral funciona por energia elétrica monofásica, e é construído em aço inoxidável e montado de forma inclinada (Figura 4/Foto 3). Possui camisa dupla contendo líquido aquecedor em seu interior. Na parte interna, é constituído por tambor perfurado que contém as uvas a serem processadas na elaboração de suco. O referido tambor gira ao redor de um eixo central, facilitando a homogeneização da massa de uvas esmagadas. O processador é comandado por sistema eletrônico que permite a regulagem da temperatura e do tempo de aquecimento, bem como da velocidade e do regime de giro do tambor interno. A capacidade de carga é de 75 Kg de uvas desgranadas e esmagadas.
Por fim, o sistema de extração por trocadores varia segundo a escala de produção. O sistema conhecido como ‘tubo em tubo’ é muito usado para a elaboração de suco de uva integral em médios ou grandes volumes (Figura 4). O conjunto dos equipamentos consiste de uma desengaçadora/esmagadora para o processamento inicial da uva, um tanque de reação enzimática conectado ao sistema tubo em tubo, onde a uva esmagada e o suco (ou apenas o suco) circulam em um tubo interno ao redor do qual circula vapor d’água quente. Um segundo tanque de estocagem acolhe o suco, uma vez completado o tempo de extração. Este tanque pode estar conectado a um sistema de resfriamento e também a um filtro para a filtração do suco (opcional). Na sequência, há um pasteurizador (para a pasteurização pré-envase) e o aparato de envase. O conjunto funciona com a ajuda de bombas de recalque, que enviam a uva esmagada e/ou o líquido para as diferentes partes do sistema.
No Vale do São Francisco, é também bastante comum o uso de um sistema onde, após o processo de desengace, as uvas são colocadas em tanques de extração verticais, onde elas permanecem estáticas, conforme a Figura 4. No centro do recipiente, existe uma peneira, que deixa passar o mosto/suco extraído, que é aquecido e circula por bombeamento, externo, retornando na parte superior da cuba, como um chuveiro. Este processo de extração demora cerca de 4 horas, sendo o suco extraído colocado em seguida em tanque pulmão, depois pasteurizado, envasado e armazenado por 40 dias, antes da comercialização.
As etapas de recebimento da uva, desgrane, aquecimento da uva desgranada, extração do suco, pasteurização, engarrafamento e estocagem fazem parte do processo de elaboração de suco tanto pelo processo de extração por trocadores de calor quanto por panelas extratoras com arraste de vapor. Adição de enzimas e clarificação são procedimentos utilizados apenas nos processos por trocador de calor (com ou sem concentração) e por maceração sulfurosa.
Características dos sucos de uva brasileiros
Em geral, os sucos de uva tintos brasileiros apresentam cor violácea intensa e brilhante, aroma frutado característico, ótima relação acidez/doçura (com acidez entre 60 e 90 mEq/L e teor glucométrico entre 14 e 20°Brix), sendo encorpados, densos, intensos, persistentes e marcantes.
Em relação ao perfil físico-químico e sensorial, os sucos de uva brasileiros podem apresentar diferenças significativas. As variações observadas estão em função da região de produção e da variedade de uva. As Tabelas 3 e 4 apresentam a composição físico-química de sucos tropicais varietais ou em cortes adotados comercialmente (LIMA et al., 2014). Pode-se observar que a quantidade de sólidos solúveis (SS) presentes nos sucos, mesmo varietais, estão próximos de 20°Brix, exceto para o suco elaborado em corte Isabel Precoce/BRS Cora que apresenta 19,4°Brix. Trata-se do conteúdo natural, sem nenhuma adição de açúcares exógenos. A acidez total dos sucos variou entre 0,68% no suco varietal elaborado com BRS Magna a 1,06% naquele elaborado com BRS Cora (em g 100 mL expresso como ácido tartárico). Diferentes concentrações também foram observadas no conteúdo de ácidos orgânicos, que variou entre 8,64 g L-1 no suco varietal de Isabel Precoce até 12,04 g L-1 no suco varietal de BRS Cora. Em regiões tropicais, os sucos tendem a ser mais doces e menos ácidos, mas a relação doçura/acidez é corrigida para níveis ideais via mesclas e outros procedimentos tecnológicos. Na Tabela 3, são apresentados os diferentes perfis na composição fenólica dos sucos varietais e cortes. Na Tabela 4, são indicados os diferentes conteúdos de fenólicos nos sucos varietais e cortes/misturas. Os sucos apresentaram diferentes valores em todos os compostos fenólicos, entre flavonóis, antocianinas, ácidos fenólicos e fenólicos totais, o que resultou em perfis fenólicos únicos.
PARÂMETROS CLÁSSICOS | SUCOS* | |||||
IP | BC | BV | BM | IPBV | IPBC | |
pH | 3,44 ± 0,02b | 3,24 ± 0,01c | 3,46 ± 0,02b | 3,62 ± 0,01a | 3,45 ± 0,01b | 3,26 ± 0,01c |
Sólidos Solúveis (SS) | 20,0 ± 0,3c | 21,0 ± 0,1a | 20,2 ± 0,1b | 20,3 ± 0,1bc | 20,6 ± 0,1b | 19,4 ± 0,1d |
Acidez titulável (AT) | 0,77 ± 0,02d | 1,06 ± 0,02a | 0,85 ± 0,04c | 0,68 ± 0,01e | 0,80 ± 0,01cd | 0,94 ± 0,01b |
Relação SS/AT | 26,2 ± 0,9b | 19,8 ± 0,4d | 23,8 ± 1,2c | 29,9 ± 0,3a | 25,8 ± 0,2b | 20,7 ± 0,2d |
Intensidade de cor | 2,78 ± 0,02f | 7,74 ± 0,01c | 11,15 ± 0,01a | 9,05 ± 0,01b | 5,29 ± 0,01e | 7,07 ± 0,01d |
Ácidos Orgânicos | ||||||
Tartárico g L-1 | 5,26 ± 0,02c | 6,32 ± 0,01a | 4,88 ± 0,10e | 5,02 ± 0,06d | 4,60 ± 0,01f | 5,42 ± 0,01b |
Málico g L-1 | 2,12 ± 0,03d | 4,15 ± 0,16a | 3,29 ± 0,06b | 3,06 ± 0,05b | 2,63 ± 0,12c | 2,54 ± 0,05c |
Cítrico mg L-1 | 457 ± 40b | 730 ± 130a | 250 ± 96c | 287 ± 12bc | 343 ± 15bc | 270 ± 17bc |
Ascórbico mg L-1 | 4,8 ± 1,2d | 10,5 ± 3,6abc | 15,5 ± 0,6a | 12,4 ± 0,3ab | 9,1 ± 2,0bcd | 6,7 ± 1,2cd |
Láctico mg L-1 | 190 ± 10d | 467 ± 83b | 390 ± 26c | 417 ± 20b | 643 ± 116a | 227 ± 32cd |
Succínico mg L-1 | 163 ± 32b | ND | 313 ± 86a | 173 ± 20b | 153 ± 75b | 203 ± 25ab |
Acético mg L-1 | 447 ± 23a | 360 ± 95a | 440 ± 36a | 433 ± 73a | 437 ± 92a | 347 ± 32a |
Total ácidos orgânicos g L-1 | 8,64 ± 0,16 | 12,04 ± 0,47 | 9,58 ± 0,36 | 9,40 ± 0,25 | 8,82 ± 0,43 | 9,01 ± 0,17 |
Médias seguidas de letras iguais, na linha, não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade de erro;
AT – expresso como g 100 mL-1 em ácido tartárico; SS – expresso como % (°Brix); ND – Não detectado;
SUCOS* | |||||||||||
FLAVANOIS | IP | BC | BV | BM | IPBV | IPBC | |||||
(+)-Catequina | 4,7 ± 0,1c | 12,4± 0,3b | 19,8 ± 0,4a | 9,1 ± 3,0b | 21,0 ± 0,1a | 17,9 ± 0,1a | |||||
(−)-Epicatequina | 1,0 ± 1,0a | 1,4 ± 0,5a | 0,6 ± 0,1a | 1,3 ± 0,1a | 0,8 ± 0,8a | 1,7 ± 0,3a | |||||
(−)-Epicatequina galato | 1,6 ± 0,1a | 1,2 ± 0,0b | 1,9 ± 0,2a | 1,3 ± 0,1a | 0,8 ± 0,2c | 0,7 ± 0,2c | |||||
(−)-Epigalocatequina | 0,9 ± 0,1e | 4,7 ± 0,4b | 6,2 ± 0,1a | 4,2 ± 0,2cb | 4,0 ± 0,1c | 2,4 ± 0,1d | |||||
Procianidina A2 | 2,8 ± 0,2bc | 2,9 ± 0,2b | 3,6 ± 0,1a | 2,3 ± 0,1c | 1,7 ± 0,4d | 1,4 ± 0,1d | |||||
Procianidina B1 | 47,1 ± 0,1b | 37,2 ± 0,6e | 44,2 ± 0,3c | 36,0 ± 0,7f | 69,4 ± 0,1a | 38,5 ± 0,1d | |||||
Procianidina B2 | 14,3 ± 0,1c | 16,3 ± 0,7b | 17,5 ± 0,5a | 17,9 ± 0,4a | 13,1 ± 0,3d | 10,9 ± 0,2e | |||||
Total Flavanois quantificados | 72,4 ± 1,7 | 76,1 ± 2,7 | 93,8 ± 1,7 | 72,1 ± 4,6 | 110,8 ± 2,0 | 73,5 ± 1,1 | |||||
Antocianinas | |||||||||||
Malvidina 3,5-diglicosídeo | 1,8 ± 0,0d | 0,7 ± 0,0e | 11,7 ± 0,0a | 5,5 ± 0,2b | 4,7 ± 0,1c | 4,8 ± 0,1c | |||||
Malvidina 3-glicosídeo | 0,9 ± 0,1d | ND | 1,6 ± 0,2b | 1,3 ± 0,3c | 1,6 ± 0,1b | 6,2 ± 0,1a | |||||
Cianidina-3,5- diglicosídeo | ND | 11,8 ± 0,1c | 38,0 ± 0,6a | 12,6 ± 0,1b | 9,2 ± 0,1d | 4,3 ± 0,2e | |||||
Cianidina 3-glicosídeo | 3,0 ± 0,0e | 1,4 ± 0,1f | 32,7 ± 0,5b | 37,2 ± 0,2a | 10,7 ± 0,1c | 7,8 ± 0,1d | |||||
Delfinidina 3-glicosídeo | ND | 11,7 ± 0,2d | 73,7 ± 1,2a | 52,2 ± 0,4b | 15,2 ± 0,2c | 3,0 ± 0,1e | |||||
Peonidina 3-glicosídeo | 0,2 ± 0,1c | 0,3 ± 0,1c | 0,2 ± 0,0c | ND | 0,4 ± 0,0b | 1,5 ± 0,1a | |||||
Pelargonidina 3-glicosídeo | ND | 6,7 ± 0,1a | 6,7 ± 0,1a | 6,6 ± 0,1a | 1,2 ± 0,2b | 0,5 ± 0,1a | |||||
Total Antocianinas quantificadas | 5,9 ± 0,2 | 30,6 ± 0,6 | 164,6 ± 2,6 | 115,4 ± 1,3 | 43 ± 0,8 | 28,1 ± 0,8 | |||||
Ácidos Fenólicos | |||||||||||
Ácido gálico | 1,8 ± 0,1e | 13,6 ± 0,1a | 10,5 ± 0,8b | 7,3 ± 0,1c | 6,4 ± 0,4c | 3,9 ± 0,1d | |||||
Ácido cafeico | 8,6 ± 0,1d | 35,8 ± 0,5a | 28,9 ± 0,4b | 41,2 ± 6,0a | 23,3 ± 0,1bc | 18,8 ± 0,2b | |||||
Ácido cinâmico | 0,5 ± 0,0d | 0,6 ± 0,2d | 1,9 ± 0,1b | 2,8 ± 0,1a | 0,4 ± 0,0d | 1,6 ± 0,0c | |||||
Ácido clorogênico | 4,1 ± 0,1d | 8,3 ± 0,3b | 21,3 ± 0,6a | 2,1 ± 0,1e | 4,8 ± 0,1c | 4,8 ± 0,2c | |||||
Ácido p-cumárico | 2,6 ± 0,1d | 4,5 ± 0,4bc | 9,0 ± 0,1a | 5,1 ± 1,0b | 3,8 ± 0,0c | 2,1 ± 0,0d | |||||
Total Ácidos Fenólicos quantificados | 17,6 ± 0,4 | 62,8 ± 1,5 | 71,6 ± 1,9 | 58,5 ± 7,3 | 37,6 ± 0,6 | 31,2 ± 0,5 | |||||
Total Antocianinas Monoméricas† | 29 ± 1f | 225 ± 1c | 464 ± 6a | 410 ± 2b | 156 ± 2d | 127 ± 2e | |||||
Conteúdo fenólico total§ | 779 ± 27d | 1944 ± 16b | 2712 ± 3a | 2097 ± 66b | 1897 ± 169b | 1353 ± 23c |
Médias seguidas de letras iguais, na linha, não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade de erro.
§Total Fenólico medido com Folin-Ciocateau e expresso como mg L-1 equivalente ao ácido gálico.
Em outro estudo realizado, definiu-se o protocolo de elaboração dos sucos de uvas tropicais comerciais, em função da temperatura de extração e da dose de enzima pectinolítica utilizada (Lima et al., 2015). Os diferentes tratamentos modificaram a composição fenólica dos sucos avaliados. Com base nos resultados, foi recomendado para fins comerciais o uso de 3 mL de enzima por 100 Kg de uvas e temperatura de 60°C, o tratamento que resultou em melhor extração e em maiores valores de flavonóis totais, e melhores resultados na coloração e na avaliação sensorial.
Em relação ao aroma, sucos de uvas tintas tradicionais como Isabel, Concord e Bordô, normalmente possuem aroma “aframboesado” associado ao composto antranilato de metila. Em variedades híbridas é comum a presença de aromas como 2’-aminoacetofenona e/ou Furanel. Nos sucos de uva brasileiros elaborados em corte/mistura ou varietais com as uvas Isabel Precoce, BRS Violeta, BRS Cora e BRS Magna, o principal aroma típico presente é o Furaneol. Os valores de furaneol nos sucos de uva comerciais e varietais variaram em função da mistura e da variedade, em valores de 0,46 a 7,93 mg L-1. O limiar de percepção sensorial do furaneol é de 0,3 mg L-1, o que demostra que este composto é bastante relevante no aroma dos sucos de uva tropicais do Brasil. O furaneol também está associado ao aroma de frutas como morango, abacaxi e manga (Dutra, Souza, Viana, Oliveira, Pereira, Lima, 2018).
Conclusões
- O crescimento do mercado brasileiro do “suco de uva”, além de estar ancorado em aspectos nutricionais, também tem por base a expectativa dos consumidores por longevidade, saúde e beleza; neste contexto, é de se esperar alto grau de exigência, quanto aos padrões de qualidade e genuinidade, em todas as etapas da sua produção;
- O aporte de novas tecnologias ao segmento de sucos de uvas no Brasil, tanto no que tange à diversificação da matriz de cultivares, quanto `a evolução das tecnologias agroindustriais, tem contribuído para a melhoria da qualidade do produto final, para a produção e expansão sustentável da atividade em regiões tradicionais e novas e para a inclusão de produtores, principalmente familiares, ao processo produtivo legal, de acordo com a legislação brasileira;
- A diversidade territorial do Brasil combinada com a diversificação da matriz brasileira de cultivares para elaboração de sucos possibilitou a adaptação da videira a diferentes condições de climas e solos, do Sul ao Nordeste, influenciando a qualidade físico-química, sensorial e a tipicidade dos produtos obtidos. De maneira geral, os sucos do sul do país são mais ácidos, com relativamente baixos valores de açúcares, boa tipicidade e vida de prateleira adequada. Os sucos do Vale do São Francisco apresentam elevados teores de açúcares, acidez equilibrada e boa tipicidade.